02 junho, 2009


Minha lembrança mais remota: eu, muito pequena, e a mãe de um coleguinha na escola contando história. As cadeiras pequeninas, azuis? O pátio grande, vermelho, a mãe do menino contava a história do homem que roubava crianças e as colocava dentro de um saco. Eu nem respirava de fascínio e terror.
Na praia de Ondina, uma mulher me ensinou a mergulhar sem fechar com a mão as narinas. Respirar forte expelindo o ar pelo nariz, expirar, expirar enquanto o rosto rompe a barra da água, e enfim, inspirar de novo.
Em Ubaíra, conheci o Chupa-imbigo, era um velho mau, se pegasse uma criança desprevenida, chupava todo o seu sangue pelo umbigo. Às seis horas da tarde, a Ave Maria soava triste no alto-falante da igreja, e como ouvidos não se fecham com as mãos, éramos obrigados a escutar toda a canção que ecoava na pequenina cidade incrustada no vale.
Para mim, era a hora mais perigosa dele aparecer. No lusco-fusco da Ave Maria, sob a sonoplastia das cigarras. Às vezes eu estava forte, outras vezes, voltava correndo e ofegante para casa de meu avô.

M.

18 comentários:

Georgio Rios disse...

Um texto sinfõnco e que delicia.Parabéns, e :Onde posso encontrar a Antologia Portico 3?

Um abraço

Senhorita B. disse...

Que delícia de texto! Sempre tive um certo encanto por esses "monstros" inventados e seu texto me lembrou dos meus.
Bjs

Bernardo Guimarães disse...

gosto muito de suas lembranças e da forma como as descreve.
que bom que vc tambem teve seu chupa-imbigo de infancia!

Anônimo disse...

Queremos mais!

Nilson disse...

Me fez lembrar dos fins de tarde em Brumado. Aquele céu que só no sertão. Belo texto!

Unknown disse...

Vim, gostei - muito!

Gerana Damulakis disse...

Lá, na infância, todos os medos são tão imensos. Tudo para que depois possa ser contado, com essa graça e encanto, sobre uma sensação que agora é especial, é memória, é uma parte do que se foi.

Giselly Lima disse...

Moraes, esses dias, descobriu Adelia Prado no banheiro entre os livros que ficam por ali também. Ficou encantado e me chamou pra ouví-lo ler um poema. Eu do lado de fora, ouvindo. Terminou e eu disse: "foi Martha que me apresentou Adelia!"
Sempre que leio uma, vejo a outra, não tem jeito.
Beijo.

Janaina Amado disse...

Gostei muio deste texto da sua menina lembrando... interessante como criança vê cores, sente cheiro e e toda sentimento, né não?

Salve Jorge disse...

Minha mais remota lembrança
Dos tempo de criança
Também tem história
Entre os vai-e-vem da memória
Perpétua dança
Um roda da infância
Tempo de glórias
Quandoa té sacodir a pança
Tinha sabor de vitória...

Lidi disse...

Medos na infância... tive tantos. Adorei relembrá-los aqui.

Katia Borges disse...

Poxa, amei esse texto. Como a infância da gente é mágica, com anjos e monstros... Lindo!

Daiane Oliveira disse...

As vezes eu estava forte
e comentava, outra corria
do seu texto, cúmplice.
Será q ela sabe o quanto
sinto o seu sentimento?

amo.

. fina flor . disse...

chupo-umbigo é bom demais, rs*

beijos, querida

MM.

>>>> ô saudade de Salvador

M. disse...

Oh, Marta, que lindo! Beijos

aeronauta disse...

Marta, seu texto é puro lirismo.

Andréia M. G. disse...

Que belo texto, Martha! Minha visita aqui hoje foi bastante proveitosa. :-)

RAINHA MAB disse...

Fascínio e terror é a minha turbulência favorita.

A Chuva de Maria

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Muadiê Maria

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