15 fevereiro, 2008


"... E o que há de lindo, de maravilhoso mesmo, neste 'você' que importa, é que o que importa não é exatamente você mas a obra-de-arte. Isto é: uma forma coletiva de vida humana. Quanto a você, no dia em que você tiver a maior consagração possível, um banquete de cinco mil talheres, um congresso de intelectuais te sagrando o príncipe, o rei, o deus das artes nacionais e internacionais, festa acabada, você terá só um sentimento dentro de si, deceopção. A festa foi pouco, você sentirá vagamente que a consagração foi pouco. Coisa danada o destino, a psicologia do artista... E em máxima parte esse castigo de ser artista, essa decepção eternamente insatisfeita creio que vem desse desequilíbrio insanável, dessa duplicidade irreconciliável: a gente dar tudo que tem, todo o trabalho, todo o pensamento, toda a dor em proveito... de outrem, da obra-de-arte, um elemento intermediário. Você não age 'sexualmente' como um santo, um missionário, um soldado, um chefe. Você cria um objeto que vai agir sozinho, por si mesmo, sem mais a interferência de você.Mas, sem que isto seja uma compensação propriamente, você visou, criou um elemento de eternidade. Este é o mistério bravo do destino do artista: visar a obra-de- arte, visar uma trancendência aleatória e problemática, que por mais que renda (aplausos, riquezas) tem outra finalidade que o rendimento, por mais desvirtuada e incompreendida, visa a permanência e busca a eternidade. Repare que só do artista já se disse, e quantas vezes! que ele é como um deus, tem o destino de Deus. Vem disso: vem do elemento de eternidade que está implícito na obra-de-arte, a única coisa que tem importância por artista verdadeiro."

Remetente: Mário de Andrade
Destinário: Fernando Sabino
Cartas a um jovem escritor
Ed. Record

(Enjolras quem me contou)

2 comentários:

Nilson disse...

Oi, Martha. Interessante que, sem ter visto antes o texto que vc postou, coloquei um de Walt Whitman no Blag hoje que é um outro ângulo, em que o poeta diz que a arte existe para o homem, qualquer que seja, e não o contrário. A visão de Mário de Andrade, de qualquer forma, é legal também. Lembra Rilke nas famosas cartas a um jovem poeta.

Eu disse...

ola adorei seu blog passarei aki mais vezes. passe tb pelo meu

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